A penalidade
* neoliberal apresenta o seguinte paradoxo: pretende remediar com um
“mais Estado” policial e penitenciário o “menos Estado” econômico e social que é a própria
causa da escalada generalizada da insegurança objetiva e subjetiva em todos os países, tanto
do Primeiro como do Segundo Mundo. Ela reafirma a onipotência do Leviatã no domínio
restrito da manutenção da ordem pública – simbolizada pela luta contra a delinqüência de rua
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– no momento em que este se afirma e verifica-se incapaz de conter a decomposição do
trabalho assalariado e de refrear a hipermobilidade do capital, as quais, capturando-a como
tenazes, desestabilizam a sociedade inteira. E isso não é uma simples coincidência: é
justamente porque as elites do Estado, tendo se convertido à ideologia do mercado total vinda
dos Estados Unidos, diminuem suas prerrogativas na frente econômica e social que é preciso
aumentar e reforçar suas missões em matéria de “segurança”, subitamente relegada à mera
dimensão criminal. No entanto, e, sobretudo, a penalidade neoliberal ainda é mais sedutora e
mais funesta quando aplicada em países ao mesmo tempo atingidos por fortes desigualdades
de condições e de oportunidades de vida e desprovidos de tradição democrática e de
instituições capazes de amortecer os choques causados pela mutação do trabalho e do
indivíduo no limiar do novo século.